Caetano Veloso, Gilberto Gil, Milton Nascimento e Chico
Buarque. Esse quarteto de talentosos compositores representou por muito tempo a
liberdade de expressão em nosso país. Perseguidos na época da Ditadura Militar,
sofreram com a repressão, foram perseguidos e exilados. Porém, usaram esse
ambiente proibitivo para dar à música brasileira algumas de suas canções mais
emblemáticas, como “Alegria, alegria”, “Cálice”, “A banda” e “Coração de
estudante”. Músicas que simbolizavam a vontade do povo de manifestar suas
ideias, de liberdade de expressão.
Eis que esse mês, esses mesmos compositores e mais alguns outros
(especialmente Roberto Carlos), vieram a público demonstrar seu posicionamento
contra a publicação de biografias não-autorizadas. Há uma lei no congresso que
pretende regulamentar esse gênero, colocando o interesse público acima da
posição particular do biografado. Os compositores criaram uma associação chamada
Procure Saber e buscam apoio de
políticos para a não aprovação dessa lei.
A publicação de uma biografia é algo muito delicado. As personalidades
públicas, por serem públicas, podem ter suas vidas devassadas? Informações que
preferem esconder podem ser publicadas? Um exemplo, ocorrido anos atrás, deu-se
com a biografia de Roberto Carlos, intitulada “Roberto Carlos em Detalhes” do
biógrafo Paulo César de Araújo. Incomoda ao compositor a história da amputação
de parte de sua perna direita, quando tinha apenas seis anos de idade, dentre
outros pontos de sua vida. O livro foi proibido de ser vendido, tendo o próprio
Caetano Veloso, curiosamente, se manifestado contra essa proibição na época.
A vida de pessoas públicas constitui parte da história de
uma nação. Contexto cultural, costumes, moda e até mesmo a linguagem podem ser
conhecidos através da análise detalhada de personagens de relevância. A
liberdade de expressão também se coloca como elemento a ser preservado. Claro
que não se quer aqui defender leviandades contra quem quer que seja. O autor
que porventura trouxesse em sua obra informações inverídicas deveria responder
judicialmente por esse fato. Mas jamais a sua liberdade de relatar fatos
deveria ser cerceada.
Lapidar o pensamento do grande
jornalista Geneton Moraes Neto: "Editoras estão com medo de publicar não
apenas biografias, mas simples reportagens em livro, por temor da lei da
mordaça biográfica. Qual é o autor que vai suar a camisa durante meses e meses,
anos e anos, para, no fim das contas, ter o trabalho condenado a mofar no fundo
de uma gaveta? Basta que o biografado - ou seus herdeiros - implique com um
parágrafo, um detalhe, uma frase. Pronto! Acabou. Já era. Basta para que o
livro vá para a fogueira - simbólica ou literal. Dezenas de livros estão
deixando de ser publicados. Não é exagero. Instala-se o silêncio, no lugar da
palavra. E, seja qualquer for o argumento que se use para justificá-lo,
silêncio nunca foi bom para o Jornalismo ou a História de um país. Nunca."
Lamenta-se, por fim, vermos ícones da luta contra a censura nesse
posicionamento repleto de egoísmo e opressão. Trazem um ranço de algo que
parecia não lhes pertencer. Pelo contrário: de algo que era seu inimigo. “É
proibido proibir”, cantava Caetano Veloso na música de mesmo título. Teriam
esquecido esse refrão?
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