quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

A maior de todas as dores




O que mais impressiona nos fatídicos acontecimentos do último final de semana ocorridos na cidade de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, não é o fato de uma boate sem licença para funcionamento estar lotada com mais de duas mil pessoas.

O que mais impressiona não é saber que um componente da banda musical que se apresentava usou um sinalizador como elemento pirotécnico, num ambiente fechado, o que causaria toda a tragédia.

O que mais impressiona não é descobrir que a casa de show não tinha saída de emergência, que os extintores não funcionaram e que o próprio material usado para o isolamento acústico seria um agravante naquela situação.

O que mais impressiona não é a notícia de que os seguranças da boate impediram diversas pessoas de saírem logo no início do incêndio, pois não tinham as comandas de consumo pagas.

O que mais impressiona não é notar que em quase todas as cidades do Brasil existem ambientes como aquele, recebendo milhares de pessoas e que não há uma legislação federal que trate do assunto.

O que impressiona realmente é ver mais de duzentos jovens sendo enterrados pelos pais, numa transgressão da ordem natural das coisas. A maior de todas as dores. Uma violência que não tem nome, que se evita nela pensar. E que assolou o Brasil desde o último domingo.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Um sonho distante



UM SONHO DISTANTE

Divulgado o resultado do vestibular da Universidade Federal de Sergipe, eis que se verificou o que todos já previam: um elevado número de aprovados de outros Estados e o número de sergipanos drasticamente reduzido. Tal fato foi uma consequência direta da mudança implementada pela Coordenação do Concurso Vestibular da UFS, que passou a utilizar o Exame Nacional do Ensino Médio – ENEM como única porta de entrada para aquela conceituada instituição de ensino.

Para ilustrar o caso, vamos aos números. Em 2012, houve 29.334 inscritos para o vestibular da UFS. Em 2013, esse número subiu para 59.389 (mais que o dobro de inscrições). Em 2012, 4.633 sergipanos aprovados. Já nesse ano, o número caiu para 3.849. Essa redução do número de sergipanos é ainda mais perceptível em cursos considerados “nobres”, como é o caso de Medicina. Das 160 vagas disponíveis em 2012, tivemos 80 sergipanos aprovados. Já para as mesmas 160 vagas deste ano, somente 20 sergipanos obtiveram êxito.

Não se pretende aqui defender medidas de restrição a quem quer que seja, afinal o vestibular é um concurso público e qualquer candidato que preencha os requisitos necessários tem o direito de pleitear a vaga. Mas o que se mostra necessário é que mecanismos sejam criados para que os pais que investiram na educação de seus filhos não vejam as vagas dos principais cursos da única Universidade pública de nosso Estado sendo preenchidas por paulistas, cariocas e mineiros, apenas como exemplo.

Cumpre salientar que essa flagrante superioridade em termos educacionais foi provocada por séculos de contrastes socioeconômicos de nosso Estado ou mesmo região em relação a outras regiões do Brasil. Assim, notadamente, o Ensino Médio não é uniforme em nosso país, o que faz com que estudantes de regiões mais prósperas obtenham vantagem em relação aos demais. É importante frisar que esses estudantes sequer precisam vir ao nosso Estado para se inscreverem ou fazer a prova. Fazem tudo isso em suas casas, só precisando se deslocarem em caso de aprovação (isso se realmente vierem, uma vez que podem se inscrever em diversas outras faculdades). Concursos públicos em geral, mesmo com inscrições feitas pela internet, exigem a presença do candidato no Estado ou mesmo na cidade no momento da prova. Além disso, teremos certamente um êxodo dos alunos formados oriundos de outros estados após a conclusão do curso. Ou seja, usarão a estrutura e os professores da Universidade de Sergipe e nada darão em contrapartida à sociedade sergipana já como profissionais.

Grandes universidades públicas do sul e sudeste do país também usam o Enem como critério de ingresso em seus vestibulares. Porém, quase a sua totalidade usa a prova do Governo Federal como apenas um dos critérios para a aprovação do aluno e não como o único. Ou seja, realizam também provas próprias para submeter aos candidatos em outras fases, o que permite que a própria instituição coloque um pouco de sua essência nesses exames. Em nosso caso, questões que tratem de nosso Estado, como se fazia em História ou Geografia de Sergipe não existem mais. E o desinteresse do aluno do ensino médio por nosso Estado e nossas tradições aumenta consideravelmente. Com a utilização das fases para o ingresso do estudante, poderíamos ter esses assuntos abordados novamente no vestibular, além de outros mais próximos da nossa realidade.

Enfim, a Universidade Federal de Sergipe precisa recuperar sua identidade, fazendo com que o sergipano efetivamente vislumbre a possibilidade de nela ingressar no curso que pretende, numa concorrência, ao menos, regional. Em nível nacional, o que teremos é uma invasão de estudantes de outros estados. E a Universidade pública e de qualidade vai se tornando um sonho cada vez mais distante para os sergipanos.