quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Vale a pena ver de novo?


VALE A PENA VER DE NOVO? – por Vicente Bezerra

Apesar do título remeter diretamente à programação da Rede Globo, o foco em verdade está na reprise das novelas do SBT. A rede paulista há meses aposentou o horrendo “Cinema em casa”, tão ruim quanto o “Sessão da tarde” e seus animais “do barulho” da principal concorrente.

Mais para tapar buraco do que arrancar audiência a emissora de Sílvio Santos jogou no ar, na fraca tarde televisiva (não só do SBT, diga-se), novelas suas, de produção própria. Isso já tinha sido feito anos antes, mas com folhetins mexicanos, onde predominam nomes compostos e tramas que ou envolve drama com irmãos ou de alguma gata borralheira.

Sem querer, Sílvio deu um tiro certo. Apesar de as novelas do SBT serem criticadas pela falta de realismo, pelo amadorismo da produção e pelo enredo superficial (ou “brega” mesmo), as reprises de “Amigas e Rivais”, “Cristal” e “Uma rosa com amor” deram um novo ar na programação da rede, mas, principalmente, incomodaram as rivais. A Record, hoje praticamente consolidada como segunda rede televisiva na audiência, viu o rival SBT tomar o seu lugar de volta às tardes, de forma quase despretensiosa. Tanto é verdade que quase não há espaço publicitário nos blocos, e entre as novelas citadas.

Não só a Record se viu incomodada. A Tv Globo teve que, às pressas, encurtar a exibição da enfadonha “O Clone”, com sua ficção científica de botequim e seus árabes caricatos e ridículos (já o eram na exibição normal). Para fazer frente às novelas “inocentes” do SBT, foi escalada “Mulheres de Areia”, campeã de audiência na época de exibição, e reprisada mais uma vez no “Vale a pena ver de novo”.

Talvez essa “inocência” dos enredos das novelas do SBT seja o ponto chave. Não se vê nelas cenas que insinuam sexo, nem grande violência. Há vilões sim, mais trapaceiros (e atrapalhados) do que realmente malvados. E todas as três citadas carregam uma leve dose de humor. Não há o exagero na presença de homossexuais (existem alguns poucos) e quase não se vêem traições entre casais, amigos ou irmãos. Mocinhos e vilões tem papel bem definido, não havendo conflitos de identidade nem deturpação do perfil psicológico de personagens, como houve recentemente em “Insensato Coração”. Não por acaso, a faixa etária dos telespectadores está acima dos 40 anos, segundo pesquisas. Vale lembrar que essa fórmula pôde ser vista recentemente na ótima produção global “Cordel Encantado”, que acabou de acabar.

Dando uma geral nas novelas citadas, “Amigas e Rivais” é uma “malhação” mais light e com mais adultos. A estória gira em torno de um grupo de amigos e amigas que vivem numa cidade fictícia e vivem às voltas com romances que não dão certo e as eternas diferenças entre classes sociais. “Cristal” conta a vida de uma moça abandonada em um convento, que vira modelo da agência da mãe biológica e, seu pai biológico, hoje é padre. Já “Uma rosa” tem como protagonista um empresário francês que, para permanecer no Brasil e com seus negócios precisa arrumar um casamento de fachada, e o faz com uma funcionária simplória de suas empresas.

Vale a pena ver de novo? De novo não, porque provavelmente quase ninguém as viu nas suas primeiras exibições, tanto que a audiência atual é maior. Mas todos estamos cansados da velha fórmula repetitiva da Globo, em que a família problemática do Leblon termina se envolvendo com os pobretões, e os “bandidos” matam, fazem a farra e enlouquecem ou morrem no final; não esquecendo os merchandising e o “fundo social” das tramas. Para quem quer que a novela seja apenas entretenimento, leve, divertido, vale muito a pena.

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Goodbye Metal Gods



GOODBYE METAL GODS – por Vicente Bezerra

Numa caravana de nove pessoas, este escriba partiu em direção a Belo Horizonte para assistir ao show de duas bandas do primeiro escalão do rock internacional: Whitesnake (hard rock) e Judas Priest (heavy metal). A viagem toda foi muito divertida, a turma era toda de conhecidos e as resenhas e brincadeiras foram muitas, tantas que renderiam um post só sobre elas. Assim também seria com a visita a Ouro Preto, que vou estudar a possibilidade de comentá-la depois. Mas vamos ao show.

Com uma pontualidade britânica "até demais", a introdução de "My Generation", do The Who, começou a tocar no Chevrolet Hall pouco antes das 21h – horário oficial do show. O Whitesnake surge no palco tocando a energética "Best Years", do álbum "Good To Be Bad", de 2008, acendendo a galera logo de cara e revelou que David Coverdale, acompanhado da fantástica dupla Doug Aldrich e Reb Beach nas guitarras, Michael Devin no baixo, Brian Ruedy nos teclados e Brian Tichy na bateria mantêm a banda em alto nível. Coverdale tem usado com inteligência sua voz – já um pouco rouca, mas ainda poderosa - se aproveitando disso nas novas composições da banda e baixando o tom de vários clássicos do grupo, compostos, originalmente, em formato bem mais agudo. David fará 60 anos ainda esse mês.

"Give Me All Your Love Tonight" e "Love Ain't No Stranger" tem o título de "indispensáveis" não é à toa. A dobradinha só não arrancou mais suspiros do que "Is This Love", que levou as (muitas e bonitas!) mulheres presentes ao delírio. Já com o público na mão, Coverdale cumprimentou os mineiros arranhando um simpático "Boa noite, Belo Horizonte" em português.

Do novo trabalho "Forevermore", veio "Steal Your Heart Away" e a bela faixa título, uma após a outra – esta última dedicada ao público. A essa altura já se notava um Chevrolet Hall praticamente lotado, considerando que muita gente foi entrando no decorrer do show, vindos do trabalho, faculdade ou de um trânsito complicado.

Já na fase final da apresentação do Whitesnake, "Here I Go Again" se destacou como uma das melhores músicas da banda ao vivo e "Still Of The Night" só fez o pique do show crescer ainda mais. As exibições de Coverdale como frontman, brincando com o pedestal do microfone, por exemplo, mostram que ele é mais que um simples vocalista, tendo status de um performer completo.

Depois da bonita versão de "Soldier Of Fortune", dos seus tempos de Deep Purple, cantada à capela, veio o maior clássico de Coverdale e cia. E por mais infame que o trocadilho seja, é impossível não deixar a platéia pegando fogo depois da dobradinha "Burn / Stormbringer", encerrando a apresentação no ápice.

Fica a interrogação para que serviram os (longos) solos de guitarra e bateria, dispensáveis para um set list curto. Como banda de abertura de luxo, o Whitesnake se despediu do público sob muitos aplausos depois de 1h20 que pareceram passar num instante.

Ajustes de palco feitos, detalhes acertados. Tudo preparado para a provável penúltima apresentação da história do Judas Priest no Brasil. Ainda viria Brasília, dia 15.

O petardo "Rapid Fire" já abriu rodas de mosh, arrancou gritos e fez a galera cantar junto logo cedo. Os diversos clássicos que vieram a seguir, como "Metal Gods", "Starbreaker" e "Victim Of Changes" mostraram que os coroas seguem mandando muito bem. Mesmo encurtando algumas notas, Rob Halford continua um vocalista excelente, principalmente nos agudos que o consagraram.

Glenn Tipton e o recém chegado Richie Faulkner – substituto de K.K. Downing, que preferiu se aposentar mais cedo - já formam uma entrosada dupla de guitarras, acompanhados por Ian Hill no baixo e Scott Travis na bateria.

O público ficou feliz em perceber que os ingleses não economizaram na super produção: jatos de fogo, telão com vídeos temáticos das músicas, trocas de pano de fundo, fumaça, lasers e Halford com vários figurinos diferentes foram um interessante complemento para um show que já começou grandioso.

E nada mais apropriado para um show de despedida do que um repertório abrangente. O set list da noite cobria toda a carreira da banda, com músicas de todos os discos da "era Halford" – a fase do vocalista Tim Owens foi deixada de lado. Nada mais justo.

Entre um clássico e outro, veio "Diamonds And Rust" - simplesmente de arrepiar -, numa versão metade acústica e metade acelerada, como no álbum "Sin After Sin", de 1977. Curiosidade: disco esse produzido pelo baixista do Deep Purple, Roger Glover e que estará no Brasil em outubro. Outra curiosidade: a versão original é da folkista Joan Baez.

Única menção do último disco da banda "Nostradamus", de 2008, "Prophecy" trouxe um Rob Halford encarnando o próprio profeta que dá nome ao álbum, com direito a tridente e tudo mais.

Já era de se imaginar que Richie Faulkner seria um grande guitarrista tecnicamente, pois já o tinha visto tocar em 2009, abrindo o show do Iron Maiden em Recife, na banda de Laureen Harris. Bem legal foi ver que ele não estava nada intimidado com o posto de músico de uma das maiores bandas de Heavy Metal de todos os tempos, mostrando que performance também é uma virtude sua.

Muitos sucessos do Priest vieram na sequência – "Nightcrawler", "Turbo Lover", "Beyond The Realms Of Death" são apenas alguns deles -, mas o melhor ainda estava por vir.

"Breaking The Law", cantada somente pelo público, foi uma saborosa mistura de sensações: a emoção de ver um hino cantado apenas por fãs contrastando com a vontade de ver o velho Halford entoar o ultra clássico refrão pela última vez.

A jóia que encerrou o set list principal do Judas Priest foi "Painkiller", música que mostrou que a banda sabe ser altamente técnica quando precisa – vide as linhas de guitarra e bateria de Glenn Tipton e Scott Travis, respectivamente. A galera foi ao delírio com a música, talvez a mais pesada da banda.

A volta do bis não poderia ser mais triunfal. "The Hellion / Electric Eye" precedeu a tradicional entrada do Metal God – alcunha que Rob Halford é chamado – sobre sua motocicleta em "Hell Bent For Leather". E como se não bastasse, ver o vocalista beijando a bandeira brasileira em "You've Got Another Thing Comin'" foi de encher os olhos d'água de muito headbanger.

O momento "Brasil" continuou com um pequeno trecho do Hino Nacional no solo do guitarrista Richie Faulkner, com a imagem da bandeira do nosso país no telão – os mais atentos ainda perceberam que nesse momento a iluminação era apenas nas cores azul, verde e amarela.

Após uma nova despedida, o palco vazio fez com que muita gente pensasse que o show já havia acabado. Eis que o baterista Scott Travis vem ao microfone para saudar a galera e pedir um coro convocando o resto da banda de volta para a última música. Foi assim que num "segundo bis" o Priest tocou "Living After Midnight" e se despediu, provavelmente pela última vez, dos mineiros.

Ao fim de um verdadeiro espetáculo é no mínimo estranho perceber que tudo ali nunca mais se repetirá. Por outro lado, ao sabermos que temos um Rob Halford sessentão – e um Glenn Tipton com 63! - compreende-se que é até bastante justo que os ingleses pendurem as chuteiras, de fato. Mas com um Rock / Metal tão carente de novos ídolos, fica impossível a nostalgia não deixar de dar as caras. Fica a obra, o legado e o prazer de ter visto um show histórico.

Tudo isso aconteceu na noite da terça, dia 13, para as primeiras horas da quarta, dia 14, meu aniversário. Os nove soldados tinham que voltar para casa. Depois de tanta diversão e esforço (físico e financeiro) para estar ali, fomos na manhã da quarta para o aeroporto, partir. Eis que a sorte nos sorri, pois encontramos todo o Judas Priest embarcando para Brasília. Tietamos e tiramos fotos (como essa do post-com Rob Halford no centro) com os músicos, aparentando cansaço. Eles e nós. Mas valeu muito a pena ver os mestres do metal, ao vivo, pela última vez na terra de Santa Cruz. Depois dessa aventura, fica a pergunta: quem precisa de Rock in Rio?

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Um novo preconceito


UM NOVO PRECONCEITO – por Moacir Poconé

Pela primeira vez, o concurso de beleza Miss Universo aconteceu no Brasil. E pela primeira vez uma mulher negra foi a vencedora. A Miss Angola, Leila Lopes, foi a autora dessa proeza.

Em seguida, no território livre (mas nem tanto) da internet se viu uma enxurrada de opiniões. Alguns internautas chamaram o ocorrido de “efeito Obama”, outros viram a vitória do politicamente correto. Várias manifestações, inclusive do público presente ao evento, elogiavam a beleza exuberante e a simpatia da miss vencedora. Mas, logo estava instaurada a polêmica: seriam racistas aqueles que não concordaram com a vitória da primeira mulher negra no tão concorrido concurso de beleza?

Acredito sinceramente que não. Beleza é questão de gosto que, em outros tempos, sequer se discutia (apenas se aceitava). As pessoas podiam inocentemente dizer se gostavam de algo ou não, se achavam algo correto ou não e, claro, se achavam uma mulher bonita ou não. Parece que esse tempo acabou. Internautas que manifestavam o descontentamento com a escolha da africana como vencedora eram chamados de preconceituosos apenas por preferir a Miss Colômbia ou a Miss Venezuela, por exemplo. Afinal, qual o problema em achar uma mulher mais bonita (ou mais feia) que outra? Não é para isso que servem os concursos de beleza?

Estamos caminhando para um tempo em que nada mais poderá ser dito ou pensado. Tudo que envolve mulher, negro, homossexual, idoso, deficiente físico ou mental e outras minorias deverá ser encarado como “indiscutível”, ou seja, ninguém pode se atrever a falar ou opinar sobre o assunto. Nem mesmo banalidades, como a escolha da Miss Universo. Não será esse radicalismo uma nova forma de preconceito?

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

"Escarra nessa boca que te beija!"


“ESCARRA NESSA BOCA QUE TE BEIJA!” – por Moacir Poconé

O título dessa postagem é o último verso da famosa poesia do grande poeta paraibano Augusto dos Anjos chamada “Versos íntimos”. Reproduzo-a para melhor entendimento do que tratarei.


Versos íntimos

Vês! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a ingratidão – esta pantera –
Foi tua companheira inseparável!

Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.

Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.

Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!


Sempre percebo das pessoas ao ouvirem esse soneto reações de nojo, de ojeriza. Óbvio que tal reação se inicia na terceira estrofe e aumenta na última quando o poeta opõe e ao mesmo tempo coloca frente a frente o beijo e o escarro. Ainda hoje, em pleno século XXI, as palavras fortes e incisivas de Augusto dos Anjos provocam estranheza e repugnância aos que as ouvem. Certamente, acostumados com palavras mais doces e poéticos nas poesias que leem (se é que leem alguma coisa).

Mas o assunto principal dessa postagem não é Augusto dos Anjos e muito menos a reação daqueles que o leem. Quero falar é do teor dessa poesia, que, escrito ainda no início do século passado, parece retratar os dias de hoje ou as pessoas que nos rodeiam. Afagos, elogios, admiração, tudo esconde um manto escuro que é o da inveja e da falsidade. O poeta nos mostra isso desde o início. O personagem com quem fala já não tem amigos. A ingratidão aparece na primeira estrofe como a única que está a seu lado, “a companheira inseparável”. E todos os desejos estão enterrados. Que deve ele fazer então?

É dada uma receita a partir da segunda estrofe. Primeiro, acostumar-se à lama. Depois, virar uma fera. Afinal, moramos entre feras. E não há espaços para piedade ou misericórdia. Qualquer ato que se pareça com tal, na verdade esconde algo terrível por trás dele próprio. É o que diz o primeiro terceto. Aquele que beija, em breve escarrará; aquele que afaga, em breve apedrejará.

No gran finale, a indicação fatal: faça com o outro o que em breve ele fará consigo. A falsidade se esconde sob diversas formas, muitas delas parecidas com carinho, compreensão ou amizade. Desconfiar de todos e agir severamente, de modo racional deve ser sempre o melhor caminho. Ninguém faz nada a não ser por interesse, seja ele qual for, tenha o objetivo que seja. É preciso acabar com o inimigo antes que nós mesmos sejamos a vítima. Lutar, antes de mais nada, contra convicções interiores que mais afundam do que nos levantam. Para que, no fim, não nos identifiquemos com os versos de Eterna Mágoa do mesmo poeta:

O homem por sobre quem caiu a praga
Da tristeza do Mundo, o homem que é triste
Para todos os séculos existe
E nunca mais o seu pesar se apaga!

Não crê em nada, pois, nada há que traga
Consolo à Mágoa, a que só ele assiste.
Quer resistir, e quanto mais resiste
Mais se lhe aumenta e se lhe afunda a chaga.

Sabe que sofre, mas o que não sabe
E que essa mágoa infinda assim não cabe
Na sua vida, é que essa mágoa infinda

Transpõe a vida do seu corpo inerme;
E quando esse homem se transforma em verme
É essa mágoa que o acompanha ainda!

sexta-feira, 2 de setembro de 2011

O melhor filme de... Robert de Niro


O MELHOR FILME DE... ROBERT DE NIRO – por Moacir Poconé

Um ator reconhecido como um dos maiores astros de Hollywood em todos os tempos (se não o maior), famoso por incorporar personagens de uma forma tão veemente que difícil acreditar que seja uma simples interpretação. Esse é Robert de Niro, estrela do cinema há mais de quatro décadas, com uma incrível média de grandes filmes em sua vasta filmografia. São mais de quarenta filmes ao longo de todo esse período. Na década de 70 do século passado surgiu ainda como uma promessa em O poderoso chefão (parte II), Taxi driver e O Franco-atirador. Na década de 80 temos Era uma vez na América, A missão, Coração satânico e Os intocáveis. Já nos anos 90, destaque para Tempo de despertar, Os bons companheiros, Cabo do medo, Sleepers - A vingança adormecida e Máfia no divã. Chegando a este milênio, nesses primeiros onze anos, já encontramos grandes filmes, como Homens de honra, Entrando numa fria e O bom pastor.

Percebam que na lista acima encontramos comédias, dramas, filmes policiais e até mesmo épicos o que dá uma noção da imensa versatilidade desse grande artista. Nesse sentido, o próprio ator comentou numa frase acerca do seu trabalho: “Os personagens que eu interpreto são reais. Eles são reais, portanto possuem o direito de serem retratados tanto quanto qualquer outro personagem.” É a visão do ator sobre a importância do ato de representar.

Recebeu diversos prêmios em inúmeros festivais, com destaque, é claro, ao Oscar (6 indicações, 2 conquistas) e o Globo de Ouro (8 indicações, 1 conquista) e ainda um Leão de Ouro honorário no Festival de Veneza em 1993, como reconhecimento a sua obra.

.........................................................................................

"Eu nunca caí, Ray. Você nunca me derrubou". Jake LaMotta a Sugar Ray Orbinson, seu maior oponente.

"Eu fiz muita coisa ruim, Joey. Talvez seja o meu troco?" Jake LaMotta    (do filme Touro Indomável)

Uma das maiores injustiças da história do Oscar se deu em 1981, quando Gente como a gente, o drama açucarado de Robert Redford venceu o espetacular Touro Indomável de Martin Scorsese. A injustiça só não foi maior porque Robert de Niro venceu na categoria de melhor ator. Hoje, Touro indomável é cultuado como um dos melhores filmes do cinema americano em todos os tempos e sempre citado como exemplo de como um ator pode se superar na composição de um papel. Para encarnar o boxeador Jake LaMotta nesse filme baseado em fatos reais, de Niro não apenas aprendeu a lutar boxe como engordou 27 quilos para viver a fase madura do personagem. Além disso, a mudança no comportamento do personagem foi retratada de maneira impressionante, sendo comentada até os dias de hoje por cinéfilos.

Em verdade, não se trata de um filme sobre o boxe. É a representação da ascensão e decadência humana que temos em Touro Indomável, desde o início até a cena final. O processo de deterioração de uma pessoa causado por seu temperamento explosivo e por seus acesos doentios de ciúmes. Indo da ingenuidade à ignorância plena, Jake chega a desfigurar o rosto de um oponente apenas pelo fato de sua esposa Vicky ter comentado que era um rapaz “jovem e bonito”. Além disso, Jake vive uma relação de amor e ódio com seu irmão Joey, interpretado também de forma impecável por Joe Pesci. Ao longo de suas trajetórias, eles conhecem as vitórias e as derrotas que a vida (muito mais que qualquer ringue) traz às pessoas.


Vivido cruamente por Robert de Niro, Jake LaMotta (O Touro do Bronx, como era conhecido) é mostrado com todas suas fraquezas, aparentemente contraditórias com a força que possui quando sobe aos ringues. De lutador campeão a um gordo dono de bar que faz piadas imbecis; de um jovem obcecado por conquistas a um corrupto entregador de lutas; de marido carinhoso e amável a um tirano obsessor e violento. São as várias faces de uma mesma pessoa que não consegue lutar contra o seu maior rival: ele próprio. A fotografia do filme todo feito em preto-e-branco acentua os tons de cinza, tornando a atmosfera um tanto quanto nebulosa, como é a vida do personagem. Ao mesmo tempo, há cenas que chocam pela violência mostrada nas lutas, com o sangue dos lutadores caindo sobre as pessoas e os seus rostos se deformando com o impacto dos socos. Interessante ainda o recurso utilizado pelo diretor para mostrar como o personagem principal literalmente “está nas cordas” como um lutador zonzo e prestes a cair: os ringues utilizados nas cenas de luta do filme são cada vez menores, dando a impressão que não há espaço nem saída para Jake.

Enfim, Touro Indomável é uma obra-prima do cinema sempre citado como um dos melhores filmes de todos os tempos. O American Film Institute, por exemplo, o coloca na quarta posição numa lista dos cem melhores. É merecido. Sem dúvida, trata-se de uma aula de cinema, um filme verdadeiramente inesquecível. Para mim, o melhor filme de Robert de Niro.