terça-feira, 13 de maio de 2014

E se ela fosse culpada?




A sociedade brasileira ficou estarrecida com o bárbaro linchamento da manicure Fabiana Maria de Jesus ocorrido na última semana. Devido a um retrato falado divulgado em uma página de uma rede social, a mulher foi confundida com outra pessoa, acusada de sequestrar e matar crianças em rituais de magia negra. O vídeo que circula na internet mostra várias pessoas agredindo ou simplesmente assistindo à execução sumária de Fabiana.

Logo veio a revelação. Fabiana era casada, mãe de dois filhos, nada havia contra ela e um livro negro que alguns julgavam ser de práticas de magia negra, nada mais era que a Bíblia. O tal retrato falado havia sido feito no Rio de Janeiro anos atrás e a população teria sido incitada pelo dono da página na internet que divulgara a imagem.  Quase que instantaneamente, o que já era um choque pela violência das cenas, transformou-se numa tragédia. Afinal, uma pessoa inocente havia sido linchada. Desde então, os órgãos de imprensa não cansam de mencionar tal fato. Há sempre um destaque, enfatizando-se que uma pessoa “de bem” teria sido injustamente alvo de criminoso. A pergunta que deve ser feita, diante dessa situação: e se Fabiana fosse culpada?

Ficou evidente que o que mais parece ter chocado a sociedade não foi o linchamento em si. Afinal, fazer justiça com as próprias mãos está em alta no Brasil e já se justifica até em veículos de comunicação. A morosidade da justiça e vontade de vingança das pessoas têm sido a explicação para isso. Tivesse sido confirmada a notícia de que a manicure Fabiana realmente sequestrava crianças e as matava, tudo estaria na mais completa normalidade. Como se coubesse a qualquer cidadão acusar, julgar e executar outra pessoa, sem que fosse dado a ela o direito de defesa. É a volta dos tempos da vingança privada, do famoso “olho por olho, dente por dente”.

Disse certa vez, Epicuro, filósofo grego: “A justiça é a vingança do homem em sociedade, como a vingança é a justiça do homem em estado selvagem”.  É essa selvageria que vem se tornando parte da sociedade brasileira. É ela que vem sendo aceita, em detrimento das instituições estabelecidas. É a vitória da vingança e a derrota da justiça.

quinta-feira, 1 de maio de 2014

Somos todos bananas!



O gesto do lateral Daniel Alves no último jogo do Campeonato Espanhol repercutiu por todo o mundo. Durante a partida contra o Villareal, um torcedor da equipe adversária atirou uma banana ao campo, numa atitude racista, comparando o jogador a um macaco. Ignorando a agressão, o jogador do Barcelona simplesmente comeu a fruta e prosseguiu o jogo, provocando a onda de referências que tomou conta das redes sociais.
 
Instantaneamente, celebridades e anônimos viraram emissários de uma mensagem que ainda hoje percorre na internet: “Somos todos macacos!”. Claro que acompanha a frase uma foto da pessoa (famosa ou não) repetindo o gesto de Daniel Alves, comendo a banana, numa espécie de solidariedade coletiva e mundial que acontece no mundo. Presidentes emitiram notas sobre o fato, programas de televisão trouxeram o assunto como pauta, as redes sociais viraram território nativo da “macacada”.

Não se quer aqui, é preciso destacar, reprovar o gesto do jogador brasileiro. Ao contrário. O racismo é ato de terrível agressão e deve ser repudiado de forma veemente ou mesmo ignorado, como assim foi feito pelo futebolista. O que está por trás do movimento #SomosTodosMacacos é que merece uma atenção maior.

Primeiro, ressaltar que a tal hashtag foi ideia da agência de publicidade de outro jogador, o craque Neymar. Ele mesmo foi um dos primeiros (senão o primeiro) a postar uma foto com o filho, comendo o fruto tropical, e a frase que iria ecoar por todo o mundo: Somos Todos Macacos. A partir daí se viu a avalanche de famosos que de uma hora para outra se tornaram defensores ardorosos de uma medida antirracista. Anônimos seguiram como uma boiada repetindo o gesto do popstar brasileiro, muitas vezes sem sequer saber o que significava aquilo.

Em seguida, o apresentador e empresário Luciano Huck, que havia postado foto com a sua esposa, a apresentadora Angélica, anuncia em sua loja virtual a “Use Huck”, a venda de camisas (na seção “Camisetas do Bem) com a banana mais uma vez acompanhada da sua agora indissociável hashtag. Compra-se a blusa ao módico preço de R$ 69,00. É o capitalismo mais uma vez por aproveitando-se da falta de senso crítico das pessoas para conseguir lucro.

E o que era um gesto de indignação caiu na mesmice de mera cópia, repetida à exaustão por aqueles que não percebem que são meros autômatos do que a mídia quer nos fazer enxergar. Não creio que sejamos todos macacos. Na verdade, somos todos idiotas. Ou, para aproveitar o momento, somos todos uns bananas!